Sobre nossas muletas psicológicas
“As pessoas se apegam a seus fardos às vezes mais do que os fardos são apegados à ela.
– George Bernard Shaw
Sentir-se apoiado, amparado e com a sensação de que alguém se preocupa com você principalmente nas horas em que mais precisa é bom, positivo e reconfortante, mas e quando esse “sentir-se apoiado passa a tirar sua autonomia, abafar sua opinião, vontade e o que é pior, tirar você de você mesmo (a)?”
Como assim, tirar você de si mesmo (a)?
Pois é exatamente assim que algumas pessoas se sentem quando deixam de fazer as coisas que gostam de fazer, quando deixam de oferecer sua opinião sobre um assunto ou outro que chama sua atenção por achar que sua ideia era improdutiva e pouco valorativa para os outros e o pior, quando acreditam que os outros são sempre melhores e sua existência é algo ausente à situação que vivenciam.
Agindo assim, elas automaticamente procuram por “apoios” que de certa forma trazem a sensação imediata de não estarem sozinhas e desamparadas.
Muitos de nós usamos essas “muletas”, procuramos esses apoios de forma consciente ou inconsciente e não é errado buscá-los, desde que os mesmos sejam realmente necessários e o mais importante, que seu uso seja breve, caso contrário corre-se o risco de “perder a capacidade de andar sozinho”.
O apoio de alguém ou algo é bom, mas acredite na medida certa, caso contrário esse mesmo “apoio” dá lugar à dependência e isso não é bom. E o que tem a ver muleta com dependência?
É exatamente o “apoiar-se em alguém ou algo” em demasia para fazer ou ser algo que queira que escora a “muleta imaginária” que muitos “andam” por aí.
Algumas pessoas colecionam muletas e acham que estão bem, outras sentem que já não precisam mais do apoio que essas muletas oferecem, mas já se acostumaram a andar com elas, outras até esqueceram que as possui, pois não sabem mais distinguir as próprias pernas da muleta que utilizam.
E assim, essas pessoas passam a viver com esses “apoios” por muito tempo, perdendo oportunidades incríveis de se encontrarem com a autonomia, a liberdade de ser e fazer o que gostam e principalmente a autoestima em sentirem que são capazes!
A insegurança, o medo de errar e de se arrepender, a dificuldade tomar decisões por conta própria e principalmente o medo de se tonar responsável por si mesmo que alimenta “o uso indevido de muletas”. Quando essas mesmas pessoas perceberem a capacidade que possuem dentro de si mesmas para resolverem essas e outras questões, acredite, não veremos tantas muletas por aí. Veremos as pessoas andarem por conta própria, com confiança e autonomia.
Não podemos generalizar e dizer que todos podem repentinamente deixar as muletas encostadas na parede, algumas pessoas precisam de um tempo de elaboração, outras precisam entender que não precisam mais desse apoio e o mais importante, precisam reaprender a andar sozinhas.
Você já viu as pessoas que quebraram o pé e tiveram que imobilizá-lo e para andarem precisaram usar muleta? Quando passa o tempo de imobilização elas precisam dispensar a muleta e andar por si mesmas, mas o medo de doer ainda existe.
Com as muletas imaginarias também tem esse medo, por isso cada pessoa tem um tempo certo para aposentar as muletas. Algumas se despedem logo e saem correndo por aí autoconfiantes, com certa sensação de alívio, outras dão um passo de cada vez, sentindo e percebendo que são capazes sim de andar com as próprias pernas. Por isso, generalizar nunca é algo bom, afinal o tempo é diferente para cada um.
E é exatamente nesse “tempo” que deve existir o respeito, a paciência e a consciência de quem nem todos conseguem dispensar as muletas sozinhos, por isso é importante a ajuda de um profissional e a psicoterapia pode ajudar.
Costumo dizer em minha prática clínica que adoro “tirar muletas”, mas na verdade gosto mesmo é de ajudar as pessoas a acreditarem que podem sim andar, correr e viver com autonomia e segurança em ser ela mesma, assim do jeitinho que é dela e somente dela, afinal, cada existência é única!
Lingia Menezes de Araújo
Psicóloga Clínica
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