Prática de musculação ameniza dor causada pela fibromialgia
Segundo médica da Sociedade Paulista de Reumatologia, novas evidências sugerem exercícios de musculação e fortalecimento para pacientes com a doença
As pessoas que sofrem de fibromialgia têm mais uma opção de tratamento não medicamentoso. De acordo com Karina Bonfiglioli, doutora em reumatologia e diretora científica da Sociedade Paulista de Reumatologia (SPR), evidências recentes¹ sugerem que a musculação e exercícios de fortalecimento podem contribuir para a melhora da dor, desde que iniciados com intensidade baixa e crescente, orientados por educador físico ou fisioterapeuta, realizados de forma regular (pelo menos duas vezes por semana) e por longo prazo.
Os benefícios podem ser sentidos após, em média, três meses.
Antes, tinha-se o conceito de que apenas as atividades físicas do tipo aeróbico, como corrida, caminhada, natação e hidroginástica, trariam benefício. Atualmente, entende-se que as duas modalidades podem contribuir para melhora da dor e da qualidade do sono na fibromialgia.
“Hoje, na fibromialgia, está sedimentado o conceito que o tratamento não deve ser baseado apenas em medicamentos, e sim uma abordagem multimodal incluindo atividade física e terapia cognitivo-comportamental”, ressalta a especialista.
Esse conceito é endossado pela Liga Europeia contra o Reumatismo (Eular)². De acordo com a organização, o tratamento não farmacológico deve ser prioridade assim que o diagnóstico da doença é dado, e o exercício físico (aeróbico ou de força) é uma das mais importantes medidas a serem tomadas.
Um artigo de revisão mais recente³ também endossa que o exercício físico deve ser indicado como primeira linha de tratamento para todos os pacientes com diagnóstico de fibromialgia. O estudo explica que a eficácia da intervenção farmacológica tem um nível fraco de evidência, e, devido aos efeitos colaterais, deve ser indicado em casos específicos (por exemplo, dor não responsiva ou distúrbios do sono).
Isso não quer dizer, entretanto, que os medicamentos devem ser descartados. Karina Bonfiglioli conta que estudos demonstraram a eficácia dos tratamentos já disponíveis, como duloxetina, pregabalina e tricíclicos.
“Novos estudos apontam que outras medicações como a naltrexona e os derivados de cannabis (canabinoides) parecem ter algum efeito positivo na dor, porém mais pesquisas são necessárias – e já estão em andamento – para endossar seu uso em larga escala”, explica a médica.
Por ser uma dor “central”, onde não há inflamação nos tecidos, pode haver uma diminuição nos neurotransmissores cerebrais, como a serotonina e noradrenalina, que regulam a dor e a sensação de bem-estar. Com isso, há uma cronificação da dor, que pode se tornar difusa e em geral não melhora com anti-inflamatórios.
“Nesses casos, a abordagem da dor deve ser multifatorial, incluindo a pratica de exercícios físicos para regular a produção de neurotransmissores, bem como a utilização de medicamentos de ação central que também vão modular a produção e metabolização dessas substâncias”, diz Karina.
O que é?
A fibromialgia é uma doença que provoca sintomas como dores difusas pelo corpo, fadiga, alterações na qualidade do sono e depressão. As regiões do pescoço, dorsal e lombar são as mais atingidas, porém todo corpo pode ser acometido.
A origem da doença ainda não é totalmente conhecida. No Brasil, a Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR) calcula que a fibromialgia afeta cerca de 3% da população. Mais de 80% dos casos ocorrem em mulheres e normalmente entre 30 e 40 anos.
“A prevenção está ligada ao risco familiar, aos exercícios físicos orientados e contínuos, além de alimentação saudável e ausência de vícios. Um apoio psicológico pode ser importante para aqueles com tendência à depressão ou ansiedade”, destaca o presidente da Sociedade Paulista de Reumatologia, o reumatologista Rubens Bonfiglioli.
O especialista alerta que o diagnóstico precoce possibilita o tratamento também precoce o que possibilita maior controle da doença.
Rubens Bonfiglioli explica ainda que a fibromialgia pode estar relacionada com doenças psiquiátricas, depressão, ansiedade e síndrome do pânico. Além de doenças reumáticas sistêmicas como artrite reumatóide, lúpus, espondilite entre outras.
“Acredita-se que substâncias conhecidas como endorfinas estão diminuídas no organismo das pessoas com fibromialgia. Essas substâncias são regularmente produzidas em nosso sistema nervoso e sua deficiência pode ocasionar as dores bem como depressão, por isso a relação entre elas”, explica o presidente da SPR.
O estresse mental e psicológico pode contribuir negativamente na piora e na dificuldade de tratar a fibromialgia.
Quando procurar um reumatologista?
A área médica da reumatologia cuida de doenças que atingem o tecido conjuntivo e aparelho locomotor, incluindo articulações, ossos, músculos, tendões e ligamentos. Geralmente, as pessoas costumam procurar um ortopedista quando apresentam dor, mas, de acordo com a reumatologista da SPR, existe uma diferença. “Ortopedista tem foco maior em lesões traumáticas e cirúrgicas, mas as doenças autoimunes, degenerativas e inflamatórias são tratadas pelo reumatologista”, explica.
Um dos alertas que as pessoas precisam ficar atentas é com a dor e inflamação em mais de uma articulação, além de sintomas gerais como prostração, febre e perda de peso. “É importante ficar atento com os sinais de inflamação articular: aumento de volume, aumento da temperatura local, sensação de rigidez matinal e dor ao repouso”, diz Karina.
A procura por um especialista deve ser levada em consideração quando o paciente sentir dor nas articulações (mãos, pés, joelho, tornozelos e cotovelos); dor na coluna vertebral; dor difusa pelo corpo; lesões por esforço repetitivo (tendinites e bursites); alterações em determinados exames laboratoriais detectados por outros especialistas e no rastreamento e tratamento de osteoporose (mulheres na pós-menopausa e homens acima dos 65 anos).
As doenças que compõem a área de trabalho de um reumatologista são divididas em grupos de acordo com sua causa. Existem as doenças reumáticas inflamatórias/autoimunes (lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide, espondilite anquilosante); degenerativas (osteoartrite ou “artrose” de joelho, quadril coluna vertebral); microcristalinas (gota, condrocalcinose); infecciosas (artrite por gonorreia, artrite em doenças virais como o Chikungunya); “reumatismo de partes moles” (fibromialgia, síndrome miofascial, tendinites, bursites) e osteometabólicas (osteoporose, osteopenia).
A área de estudo é relativamente nova no Brasil, se comparado com outras áreas da medicina mais tradicional. A reumatologia tem 70 anos no país e conta com aproximadamente 3 mil médicos brasileiros, só 800 no Estado de São Paulo.
O Encontro
A fibromialgia e outros assuntos relacionados aos estudos da reumatologia serão discutidos no 23º Encontro Rio-São Paulo de Reumatologia e no 13º Curso de Revisão para Reumatologistas, que serão realizados em São Paulo, nos dias 14, 15 e 16 de março.
O evento é organizado pela Sociedade Paulista de Reumatologia, em conjunto com a Sociedade Brasileira e a do Rio de Janeiro, com intuito de promover a atualização científica dos especialistas, bem como intercâmbio de informações e experiência na área. O encontro vai abordar as principais doenças reumatológicas e os mais recentes métodos diagnósticos, além dos tratamentos disponíveis.
Serão debatidos aspectos referentes ao diagnóstico e tratamento das seguintes doenças: Gota, artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico, dor, osteoporose, espondiloartrites, vasculites, síndrome antifosfolípide e esclerose sistêmica.
Serviço
23º Encontro Rio-São Paulo de Reumatologia e 13º Curso de Revisão para Reumatologistas
Hotel Maksoud Plaza: Rua São Carlos do Pinhal, 424 – Bela Vista, São Paulo – SP
Dias 14, 15 e 16 de março 2019
8h às 17h
Fontes:
1: A systematic review of the effects of strength training in patients with fibromyalgia: clinical outcomes and design considerations. Andrade A1,2, de Azevedo Klumb Steffens R3,4,5, Sieczkowska SM3,4, Peyré Tartaruga LA6,7, Torres Vilarino G3,4. Adv Rheumatol. 2018 Oct 22;58(1):36. Doi: 10.1186/s42358-018-0033-9.
2: EULAR revised recommendations for the management of fibromyalgia. Macfarlane GJ, et al. Ann Rheum Dis 2017;76:318–328. Doi: 10.1136/annrheumdis-2016-209724.
3: One year in review 2019: fibromyalgia. F. Atzeni et al, Clinical and Experimental Rheumatology 2019.