Metanol: o que é esse composto que tem provocado intoxicações e por que ele é inapropriado para consumo humano
Conselho Federal de Química reforça riscos e explica por que a substância é imprópria para consumo humano.
Casos recentes em São Paulo acenderam o alerta para um problema grave de saúde pública: ao menos nove pessoas foram intoxicadas após consumir bebidas alcoólicas adulteradas com metanol. Três mortes já foram confirmadas. Mas, afinal, o que é esse composto químico, para que ele é utilizado e por que representa risco quando ingerido?
O Conselho Federal de Química (CFQ) já havia alertado, em janeiro deste ano, sobre episódios semelhantes registrados no exterior, como em Laos, onde seis turistas morreram após consumir bebidas contaminadas. Agora, a ameaça deixa de ser apenas internacional e se confirma também no Brasil. Segundo informações da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (Senad), do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, o número de ocorrências registradas em São Paulo foi considerado “fora do padrão”.
O que chama a atenção é o novo perfil das intoxicações. De acordo com o Centro de Informação e Assistência Toxicológica de Campinas (Ciatox-SP), noticiado pela BBC Brasil, até então os casos estavam associados, em sua maioria, ao consumo deliberado em contextos de abuso de substâncias, muitas vezes envolvendo a população em situação de rua. Desta vez, entretanto, a contaminação ocorreu em bares e festas, envolvendo diferentes tipos de destilados, como gin, uísque e vodca.
O que é o metanol?
O metanol (CH₃OH) é um líquido incolor, volátil e inflamável, amplamente utilizado pela indústria química. Serve de matéria-prima para a produção de formaldeído, ácido acético, biodiesel, resinas, solventes, tintas e outros produtos industriais. Em pequenas quantidades, pode ocorrer naturalmente em frutas ou surgir como subproduto da fermentação alcoólica, mas em níveis ínfimos, sem risco para o consumo.
De acordo com o analista químico e representante do Sistema CFQ/CRQs, Siddhartha Giese, o metanol é comumente utilizado na fabricação de substâncias químicas com diferentes usos. “Como matéria-prima na fabricação de compostos como formaldeído, ácido acético, biodiesel e resinas. Também pode estar presente em alguns solventes industriais e em formulações de tinta. Em frutas e bebidas fermentadas, surge em quantidades muito pequenas que, em condições normais, não oferecem risco à saúde.”, explica.
O problema acontece quando é usado de forma indevida na adulteração de bebidas alcoólicas, prática criminosa e de alto risco à saúde.
Siddhartha explica que o metanol pode afetar o organismo de duas formas: através de efeitos imediatos e efeitos tardios. “Os efeitos imediatos, que ocorrem do início até 48 horas após a ingestão, incluem depressão do Sistema Nervoso Central (SNC) e irritação gastrointestinal, com sintomas como náuseas e vômitos”, detalha.
Efeitos no organismo
A ingestão de metanol pode provocar sintomas imediatos como náusea, vômito, tontura e depressão do sistema nervoso central. O perigo maior, no entanto, aparece nos efeitos tardios. No organismo, o metanol é metabolizado primeiramente em formaldeído e, em seguida, em ácido fórmico, que provoca acidose metabólica — um desequilíbrio grave do pH sanguíneo. Os sintomas incluem respiração acelerada, aumento da frequência cardíaca, dor abdominal persistente e, principalmente, danos à visão.
A ingestão de pequenas quantidades pode ser suficiente para causar cegueira permanente. Estima-se que doses entre 4 e 10 mL já podem provocar lesões irreversíveis, enquanto 30 mL de metanol puro podem ser letais.
Quando a exposição ao metanol atinge doses mais altas, os danos se tornam ainda mais graves, como informa o analista químico. “A menor dose tóxica de metanol registrada em humanos foi de 340 mg por quilo de peso corporal, o que significa que uma pessoa de 70 kg poderia sofrer efeitos graves — potencialmente letais — já com cerca de 24 g (aproximadamente 30 mL) de metanol puro, tornando o consumo de bebidas adulteradas uma ameaça real à vida”, alerta.
Prevenção e controle
A orientação é clara: verificar sempre a procedência das bebidas adquiridas, desconfiando de preços muito abaixo do mercado e de produtos sem registro. A fiscalização governamental e os controles laboratoriais periódicos são medidas essenciais para prevenir tragédias.
“Esses produtos podem ser adulterados com metanol ou outras substâncias perigosas. Além disso, a fiscalização rigorosa de órgãos governamentais é essencial para coibir a produção, distribuição e comercialização de bebidas adulteradas”, ressalta.
O analista ainda destaca que é importante que empresas do setor realizem análises químicas periódicas para garantir a qualidade e segurança dos produtos, além de informar a população sobre os riscos do consumo de bebidas adulteradas.
Nesse processo, os Profissionais da Química desempenham papel decisivo. Por meio de análises laboratoriais, são capazes de identificar contaminantes em bebidas e alimentos, atuando em cooperação com órgãos de vigilância e fiscalização. Além disso, têm a responsabilidade de informar e conscientizar a sociedade sobre os riscos do consumo de bebidas adulteradas.
O CFQ, por meio da sua Central de Informações da Química (CIQ), já vem contribuindo para esclarecer casos como o registrado em São Paulo e reforça a necessidade de maior conscientização pública sobre os perigos do metanol.