Nem Tudo Que Parece É
Por Sah Elizabeth
Maria é catadora de papel. Acorda todos os dias, pega seu carrinho e sai feliz com a possibilidade de encontrar muita coisa que lhe renda o seu sustento. Sente-se bem por fazer algo que ajude tanta gente e lhe dê o que comer e o que vestir. A todo momento olha para o que conseguiu catar e para todas as coisas que já têm e agradece a boa saúde para lutar.
Bárbara é uma burocrata. Trabalha num grande escritório envidraçado, cheio de equipamentos. Todos os dias acorda, toma seu café, pega seu carro e sai para mais um dia igual. Nenhuma novidade, a mesma chatice, o mesmo tédio de sempre. Ao menos, pensa ela, tenho o suficiente para minhas roupas de grife, meus sapatos bico fino, minhas bolsinhas Victor Hugo e de vez em quando uma viagem mais longa. A todo momento olha para a pilha de papel e reclama o tanto de trabalho, lembra do que ainda não conseguiu comprar e sente-se injustiçada por lhe faltar tantas coisas.
A vida pode ser mesmo muita injusta. E é também espantosamente irônica e paradoxal: põe o muito no pouco e muito pouco no muito. Distribui a alegria conforme o coração, para os grandes muita, para um mesquinho, quase nenhuma. Mede a riqueza de seus passantes não por aquilo têm, mas pelo que são capazes de dar.